VIDA DE CACHORRO
Como pode tal homem que abandona um pobre cachorro na rua e ir a igreja no domingo, tomar à hóstia sagrada, cumprimentar os irmãos, se camuflar de gente, dizendo-se ser gente.
Ele não passa de um primitivo, um desprezível, um homem bicho (sem querer ofender aos bichos), o desalmado.
O pobre cachorro solitário, sem consolo, sem alento, num verdadeiro deserto de aflições.
Às pessoas da cidade, falam coisas que o canino isolado não entende, aquilo não é seu mundo, seu quintal. Infeliz cão, já teve pátria, idioma, casa comida, foi feliz.
Hoje em sua alma ele só tem raiva do seu ex-dono, e nessa vida miserável, tudo para ele é um pranto, e mesmo com raiva espera o momento que o seu dono volte, para que parta com seu rabinho abanando, para agarra-se as pernas dele como se nada tivesse acontecido.
O frio, o sereno da noite, e o gemido solitário do miserável cachorro que dorme nas calçadas, são alusões daqueles que não acreditam mais nos bichos.
Por misericórdia um anjo joga-lhe um osso. E a vida passa, vida de cachorro!
Os carros passam no asfalto, nas ruas, um tédio. noite mal dormida, e o cachorro só queria um pouco dos muros da casa onde ele lê livros, esquece o podre da solidão e respeita o lixo.
Se é que vocês me entendem.